segunda-feira, 18 de julho de 2011

Exames em Diferido


Visite-se o relatório (aqui) dos exames nacionais de 2010, páginas 29 e 30, referentes ao exame de Desenho A. As páginas 29 e parte da 30 são aquilo que na gíria se designa de “palha”. Na página 30, oferece-se a "cereja": os melhores e os piores parâmetros, sendo o melhor “o domínio e aplicação de princípios e estratégias de composição...”. Nem vale a pena comentar o sucesso deste parâmetro. Basta uma leitura breve do enunciado e dos descritores e cora-se de vergonha...Quanto aos “Parâmetros com pior desempenho”, o destaque recai na “capacidade de síntese: transformação – gráfica e invenção”, “com um valor de cotação média em relação à cotação máxima de 50,5%”. Prosseguindo a leitura, chegamos às “Propostas de intervenção didáctica” ou, num português mais simples, o que deverá ser feito na sala de aula: “Como medidas de superação destas dificuldades, propomos uma prática lectiva mais atenta ao desenvolvimento da criatividade e da imaginação”, e a coisa prossegue nesta toada. O que não é incluido neste relatório paupérrimo é a  reflexão (auto)crítica incidindo nas finalidades e estrutura do exame. Para os senhores relatores, estaremos perante a fórmula ideal, a pedra filosofal da avaliação. Não questionam a xaropada reiterada dos referentes artísticos contemporâneos nas questões que propõem o “desenvolvimento da criatividade e da imaginação”. Não questionam a imposição patética de meios atuantes – como o pastel de óleo – que quase ninguém utiliza - e, mais grave ainda, que não permitem (considerando as limitações do exame: tempo de execução, dimensão do suporte, tensão,...) o almejado esparramar da “criatividade e da imaginação”. Este relatório anorético não questiona o papel do Ministério da Educação na demolição do currículo das Artes Visuais, retirando aos alunos o conhecimento de matérias essenciais, quer por via da amputação, seguida de prótese disfuncional, do programa de História das Artes (que deveria acompanhar todo o ciclo do secundário) quer pela eliminação (em 2005 se a memória não falha) da disciplina de Teoria do Design (que permitia a compreensão e consolidação de saberes, para além da definição de opções no prosseguimento de estudos numa área que está na base de muita da riqueza das nações). Chegamos a 2011 e aos resultados alcançados: uma lástima previsível. As razões deduzem-se, parcialmente, do anteriormente exposto, acrescidas do facto do universo de alunos de artes visuais conter uma mole imensa de estudantes "inertes", com pouca curiosidade artística, (impera o universo gráfico repetitivo dos jogos de vídeo, de mangas de  qualidade inferior e dos concursos patéticos de "estrelas" disto e daquilo), com espírito crítico inexistente no capítulo dos deveres e, principalmente, sem a paixão necessária para prosseguir numa área que exige uma prática intensa e regular. Quanto aos alunos e alunas que não se encaixam nesta categoria (e que existem), uma boa parte terá sido torpedeada pela forma abstrusa do exame, em particular no grupo que apelava à tal “criatividade”. Espera-se - quiçá ingenuamente - que a "criatividade" não faça aparição na 2ª chamada.

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Ligação rápida: Artes - Desenho - Geometria Descritiva